terça-feira, 19 de abril de 2011

Devolução do aumento salarial (uma questão de consciência)

Esse começo de ano tem sido “muito bom” para nós, vereadores do Rio de Janeiro. Primeiro tivemos a noticia de que, após mais de 20 anos, a Câmara retomaria um antigo beneficio: os carros oficiais. Depois, no dia 1º de abril, acreditem se quiser, fomos agraciados com uma bolada relativa a um aumento de mais de 60% em nossas contas bancárias (com direito a retroativo desde fevereiro e reajuste no auxílio-paletó).

O mais curioso desses casos é perceber que os benefícios ao legislativo municipal não foram resultado de um reconhecimento popular pelo bom trabalho prestado, eles foram concedidos pelo próprio legislativo.

Em ambos os casos, pautei minha conduta na minha consciência e recusei os “mimos”. É importante frisar que os meus colegas vereadores que aceitaram o carro e o aumento não estão cometendo nenhum crime, já que estão amparados pela lei. No meu entendimento, o problema é uma questão de consciência.

Sei que nós vereadores precisamos de carro para exercer nossas funções parlamentares e, portanto, o carro oficial é “justificável”. Sei que nós vereadores temos uma grande responsabilidade e, portanto, o novo salário de R$15.000,00 é até “justificável” para quem trabalha sério.

No entanto, se observarmos que os servidores municipais aguardam um reajuste de 6% e sofrem com nosso péssimo serviço de transporte público (cujos empresários receberam diversas vantagens), fica difícil aceitar carro e aumento sem nos sentirmos minimamente constrangidos.

Além disso, o caso especifico do aumento salarial envolve ainda outra questão. Não bastasse seu valor elevado (mais de 60%), o reajuste ocorre no meio de nosso mandato. Isso ocorre, pois, pelo menos desde 2001, os vereadores adotaram uma medida que me parece no mínimo polêmica.

Explico: a lei proíbe parlamentares de legislarem em beneficio próprio, portanto, cada legislatura vota o aumento do mandato subsequente. Entretanto, ao invés dos vereadores cariocas fixarem um valor para os vencimentos do quadriênio seguinte, eles estipulam uma percentagem em relação ao valor do salário dos deputados estaduais.

Como as eleições para a Assembléia Legislativa ocorrem de forma intercalada com a eleição para a Câmara, criou-se a possibilidade de recebermos o aumento junto com os deputados, no meio do nosso mandato, com dois anos de antecedência. Essa pequena manobra talvez nunca fosse notada, não fosse o aumento absurdo aprovado no congresso, abrindo nossos olhos. Repito: a manobra não é ilegal.

A política nunca foi capaz de me deixar rico, mas sempre garantiu o conforto que julgo necessário, mantendo o padrão de vida que levava quando exercia minhas atividades médicas. Dessa maneira, possuo carro particular (recebo um belo auxílio-combustível da Câmara, diga-se de passagem), moro num apartamento confortável (alugado) e ainda posso me dar ao luxo de cultivar meu hobby com um belíssimo time de botão.

Não quero parecer demagogo. Adoraria receber esse aumento e o carro. Trata-se apenas de uma questão de prioridades. Tenham certeza: se um dia conseguirmos deixar a saúde, a educação e a segurança pública nos patamares que eu e meus eleitores desejamos, serei o primeiro a pleitear um generoso aumento. Até lá, continuarei pautando minha conduta na minha consciência.