sábado, 5 de novembro de 2011

Reproduzo nesse espaço artigo publicado no Jornal O Globo de hoje, cujo teor endosso plenamente e que entendo exprimir a realidade nacional e a local, principalmente a política de terceirizações adotadas pelos governos estadual e municipal.

É preciso estatizar o governo

MARCO POLO RIOS SIMÕES

As pessoas imaginam que o pior da corrupção é o dinheiro subtraído dos cofres públicos, que daria para construir casas, redes de esgoto e outras necessidades da nossa sofrida população. Porém, com o passar do tempo, a corrupção destrói a máquina pública, o que compromete a capacidade do governante de fazer qualquer coisa, mesmo que queira. Hoje, o governo brasileiro é incapaz de tomar conta de uma estrada.
Ao ingressar na máquina pública, a primeira coisa que o corrupto faz é escantear os concursados e nomear amigos para ocupar os principais cargos. Esse quadro de alta rotatividade nos cargos de comando é comum nos ministérios e secretarias estaduais e municipais.
Nos países desenvolvidos a máquina pública é estável — defende o órgão de eventuais aventureiros. No Brasil, é o contrário: os servidores é que se defendem, encostando-se em algum canto para não incomodar os “invasores”. Prevalece um clima de temor em denunciar irregularidades, pois o funcionário sabe que a eventual queda de um urubu só significa que outro irá para seu lugar e o perseguirá. A CPI dos Correios chegou a propor uma legislação que premiasse a denúncia e impedisse prejuízos ao servidor que abrisse o bico. A ideia não foi adiante.
O servidor percebe a inutilidade de se dedicar à sua carreira, de se especializar para melhorar os serviços prestados à população. Ao invés de evoluir com o tempo, a administração pública trilha o caminho contrário: piora a cada ano.
A máquina pública brasileira atingiu tal grau de desestruturação que vigora a completa descrença na sua capacidade de produzir algo de útil. Mesmo que o governante da hora decida que sua reeleição depende de fazer algo que preste em uma área chave, não contará com uma estrutura capaz de realizar sua vontade.
E é aí que surge a solução miraculosa: privatizar tudo. Estradas, hospitais, aeroportos, telefonia, banda larga — tudo foi ou vai ser privatizado por conta da incompetência do Estado. Com o pretexto da Copa do Mundo, fala-se até mesmo em privatizar a segurança pública. Note-se que estamos em um governo do PT, partido que se dizia radicalmente contra as privatizações.
E tudo vai continuar sendo privatizado da pior forma possível. Fosse o Brasil um país capitalista, o caminho de qualquer privatização passaria pela abertura de capital e venda de ações em Bolsa, dando oportunidade a todos os brasileiros de participar do negócio que envolve o seu patrimônio, o patrimônio público.
Ainda assim, se privatização resolvesse o problema, seria ótimo. Mas não é isso o que assistimos. São de péssima qualidade ou muito caros todos os serviços que são concessões públicas, como estradas, portos, bancos, banda larga e canais de TV a cabo. Repito: o governo atual está planejando incluir na lista hospitais, aeroportos e até a segurança pública.
Na área social não é diferente. Incapaz e capaz de tudo, o governo privatiza R$10 bilhões por ano com ONGs, a pretexto de executar políticas sociais, usando a desculpa de que o Estado não tem máquina pública para fazer coisa alguma.
Não há um só ministro, desses 38, que ocupe o cargo em função de sua experiência e capacidade técnica. Não há um único que ocupou o cargo e se espantou com o estado lastimável da máquina pública.
Governar significa administrar. E para administrar é preciso ter uma máquina pública eficiente e estável. É preciso estatizar o governo brasileiro.

MARCO POLO RIOS SIMÕES é servidor público, auditor do Tribunal de Contas da União.

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